STJ altera entendimento e exige apresentação de certidões negativas de débitos fiscais para homologação de recuperação judicial
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) alterou seu entendimento sobre a obrigatoriedade de apresentação de certidão negativa de débitos fiscais (CND) para a homologação do plano de recuperação judicial.
A discussão gira em torno do art. 57 da Lei nº 11.101/05 (Lei de Falências e Recuperação de Empresas – LFRE), que exige a apresentação das certidões negativas de débitos tributários, após a juntada do plano de recuperação aprovado pela assembleia-geral de credores, bem como condiciona a concessão da recuperação judicial à apresentação de tais certidões.
O entendimento que vinha se consolidando nos Tribunais nos últimos anos caminhava para a dispensa das certidões negativas tributárias, sob o fundamento de que os créditos do Fisco não integram a recuperação judicial, de modo que exigir certidões negativas constituiria a imposição de um ônus muito elevado para as empresas em recuperação, que ficariam impedidas de negociar com o Fisco, com o mesmo grau de liberdade com que fazem como os demais credores. Além disso, a jurisprudência baseava-se no fato de o art. 47 da Lei 11.101/05 conter como princípios, que devem nortear a interpretação LFRE, o princípio da preservação da empresa, a função social e a manutenção da fonte produtora, de maneira que o art. 57 deveria ser relativizado em prol de um bem maior.
No entanto, o caso analisado pela STJ, recentemente, representa o início de uma mudança de entendimento. No processo em questão, um grupo de empresas do segmento de eventos digitais recorreu de decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que exigiu a apresentação das certidões para a homologação do plano de recuperação judicial. Para a empresa, não existem fundamentos jurídicos que justifiquem a extinção do processo pela não apresentação das certidões negativas de débitos tributários. A 3ª Turma do STJ, entretanto, entendeu que atualmente é possível exigir-se certidões negativas tributárias.
De acordo com o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze não é possível admitir a dispensa das certidões sob o fundamento de aplicação dos princípios da função social e da preservação da empresa (art. 47), sobretudo após a implementação da Lei nº 14.112/20, que alterou a LFRE e instituiu a transação dos débitos do contribuinte em recuperação judicial. De fato, o art. 10-A da Lei 14.112/20 prevê a possibilidade de transação entre a empresa em recuperação e o Fisco, a fim de se buscar um parcelamento em até 120 meses.
Todavia, a transação tributária não comporta muita flexibilidade de negociação, ao contrário do que ocorre com os demais credores, pois se assemelha a um parcelamento incentivado.
Além disso, o Fisco tem se preparado para realizar a negociação tributária com as empresas em recuperação, de forma a posicionar-se como um “super credor”. Um exemplo disso é o Edital PGE/TR nº 01/2021, da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo, que exige da empresa em recuperação judicial a apresentação de seguro-garantia para celebração da transação e, como é sabido, quando uma empresa se encontra em recuperação judicial passa ser muito difícil e custoso obter tal seguro perante as instituições autorizadas, em vista da classificação de crédito negativa imposta às recuperandas.
Assim, a nova decisão da 3ª Turma do STJ, embora não tenha efeito vinculante, representa um precedente desfavorável às empresas em recuperação judicial, consolidando o Fisco como um credor ultraprivilegiado, uma vez que a exigência da equalização do crédito pode inviabilizar o cumprimento do plano. Frise-se que o Fisco não participa do processo de recuperação judicial, uma vez que não está submetido ao plano de recuperação e não participa da aprovação deste juntamente aos demais credores.